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Diários da Quarentena Post 1 - Mariana Munhoz



Olhou para a garrafinha transparente quase completamente preenchida por água e raízes. 
A palmeira estava ainda verdinha e exalando vida. Lembrou-se do dia em que aquele delicado presente  chegou. Veio junto com o frescor do amor recém declarado e com a novidade de juntar as vidas que outrora caminhavam separadas. Naquele instante, sorriu. 
Olhou em volta. 

Casa pequena. Casa bagunçada. Mas era casa. Será que ainda era casa mesmo? A sala virou escritório. O quarto, academia. A cozinha, sala de reunião. 
Era o lugar onde já estava há 4 semanas sem sair. Dias de isolamento. O ano em que o mundo parou. Foi obrigado a parar, na verdade.
O inimigo, invisível. Microscópico. Fez-nos ter medo do contato humano.  
Tic tacTic tac
O tempo 
agora se arrasta 
mais do que nunca. 

O mundo realmente parou. Ninguém se toca, ninguém se encosta. Ninguém se beija, ninguém se abraça. O medo tomou conta. Medo do incontrolável. Medo da dor. 
Mas a palmeirinha continuava lá.  Verdinha e exalando vida. 

Comentários

  1. Expressão dos nossos dias!!👏🏻👏🏻👏🏻

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  2. "Mas a palmeirinha continuava lá. Verdinha e exalando vida" 🌿 Pude sentir o frescor do verde da Palmeira que existe, insiste, resiste. Sejamos como ela! Belo texto!

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