Pular para o conteúdo principal

Colcha de Retalhos - Yvanna Vyva

Carrego vários corações em meu peito e muitos já tive nas mãos

Variados tamanhos, formas e forças

Bacanas, babacas, patifes

Leais, fiéis, traidores

Religiosos, ateus, bonitos

Casados, feios, solteiros

Corações bons e ruins, amores


É que o amor sempre me encontra e trás boa sorte

Eu tive uma infância cruel, embora não parecesse

O que se via era o mito de uma família feliz

Eu tive uma juventude sofredora, embora não parecesse

O que se via era o mito da bela donzela feliz

Mas foi ali no meu passado cruel e sofrido

Que vivi momentos de verdade, de mais amores vividos

do que amores sofridos


Subitamente, eu tinha a sorte de ter alguém que me amasse

Repentinamente, a sorte de escolher o amor se quisesse

Eu geralmente queria, como alma que abraça o mundo

Com certa alegria que tocava em tudo


Toda vez que penso, me espanto ao ver que meu pranto logo virava riso

As lágrimas quentes na pele seca, faziam-se úmido deleite e regozijo


O choro convertido em sonhos

O abandono virado em desejos

A mentira partida ao meio, escancarando as verdades

As correntes que se arrastavam, agora arrebentadas.



Fiz para mim uma colcha de retalhos, com os pedaços que guardei de cada amor

Costurei-os com agulha de decepção e bordei com linha da paixão

Foi um cobertor curto, até bem pouco tempo

Só me cobria a cabeça, ou só me cobria os pés

Eu precisava amar mais e completar a cobertura das minhas vulnerabilidades.

Completei, estou aquecida. Tenho meus próprios recursos, e a colcha inteiramente tecida.

E o amor ainda me encontra, trazendo a boa sorte

De começar a tecer colchas desnecessárias. 


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

É preciso ir para algum lugar? - Vera Barrozo

  É preciso ir para algum lugar? Parei. Aqui. Ao sol. Nessa cidade que não conheço... bebo uma água com limão. Pessoas caminham...  Passam. Estar...  Estar aqui.  É Paris. (Foi tanto tempo pra chegar aqui!) Agora cheguei. Nessa mesa... E já cá não estou. Porque as letras, os rumos, os objetivos de um itinerário turístico escrito por alguém – mais provavelmente dezenas – ou centenas – de pessoas me pretende dizer o que devo fazer para... (ter estado aqui) ... agora, que cheguei aqui. Não basta estar. Não basta respirar. (Se estou em Paris, há um roteiro inteiro: enorme, quilométrico, longo, antigo, moderno...) NADA de minusculinidades... Quem é você... Que vem a Paris  para sorver  o  ar da  luz  que é  re fle ti da  ao seu redor???

Hoje não é dia do índio - Karenina Bispo

                                            Créditos da foto: Folha de São Paulo O “Dia do Índio” Eu me senti instada a falar de mim. No dia 19 de abril, foi lembrado do dique costumávamos chamar de “Dia do Índio”. No Instagram eu fiz a publicação de um Reels em que alguns indígenas falam da diversidade de seus povos, populações que já estavam aqui e habitavam este país quando houve a invasão portuguesa que dizimou a maior parte dessas populações e apagou sua cultura e existência. “Hoje não é dia do índio” dizia o vídeo.  Falando de mim, eu devo admitir que já fui essa pessoa que questionou a “legitimidade desses povos” e questionei à época se ainda “existia índio” no Brasil, sendo estes civilizados. Mas que grande preconceito, não é mesmo? Admito também que já fui uma pessoa contra cotas, fossem elas quais fossem. Mas nossa! Como o tempo passou e me fez bem! Como pude aprender neste tempo! E sim, hoje considero a política de quotas fundamental para promover o acesso de populações ante

Árvore - Ana Keller

  Tenho de sair porta afora! Quase como se, se não o fizer, interrompo o fluxo respiratório. E não apenas porta afora, mas árvore a dentro. Qual será dessa vez? O templo no qual vou entrar? Ah ! Lá está ela ! Parece ferida no tronco. Não, não é uma ferida. É uma cicatriz. Uma cicatriz aberta. Mostra que a criatura já superou a dor, mas continua exibindo o tamanho do ataque que sofreu. Quando Ela, no topo, se abre em galhos, esses são robustos ao invés de elegantes como os que  costumo apreciar. Como são os cactos nos desertos. Ah ! Entendo a experiência desse Templo em que penetro agora ! Esqueço-me de onde venho e nem me importo para onde vou. Respiro a abundância do meu dentro. Sinto as carnes, as veias e os nervos incharem-se. Está imenso o meu interior. E não é preciso pensar, nem elaborar nada. Basta deixar a língua passear nos lábios e saborear essa montanha de Eu que Sou entre as paredes do meu Templo. O rito prossegue e sinto toda a gente que Sou sendo abençoada. Circulo desde